Distúrbios Alimentares em Crianças e Pré-Adolescentes

Garotas pré-adolescentes apresentam mais medo de engordar, do que de guerra nuclear, câncer, ou perder um dos pais 

University of Colorado at Boulder

Os seres humanos precisam de comida e água para viver. As crianças, especialmente, precisam comer alimentos saudáveis – e em quantidade suficiente – para crescer e se desenvolver.

Mas, para algumas crianças, o que elas costumam ouvir é alguém dizer que a comida os torna “gordos” ou eles podem começar a se preocupar com seus corpos e como eles se parecem – e algumas crianças, diante disso, podem parar de comer bem, comer muito pouco, ou tentar vomitar depois de comer.

Infelizmente se tem começado a detectar casos de anorexia e bulimia em idades cada vez mais precoces. A maioria dos casos se apresentam na adolescência, mas profissionais da área tem percebido que existem casos cada vez mais frequentes em crianças com menos de 10 anos.

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A idade de início tem retrocedido cada vez mais. Existem casos na literatura médica de crianças de até cinco anos de idade que se negam a comer, recusam alimentos e vomitam voluntariamente porque tem medo de engordar. Estas crianças estão envolvidas em um meio ambiente, o qual muitas vezes, não estão somente expostos à família, muitas vezes pode ser o ambiente escolar, ou até mesmo estas crianças podem ser induzidas por um estigma da cultura do corpo. Muitos pais têm medo que a criança engorde, adotando assim, uma cultura fóbica em relação ao peso e em nome de uma alimentação saudável, restringem demais a alimentação da criança que passa a viver uma situação diferente das demais.

Muitas mães sofrem elas mesmas de distúrbios alimentares; estas mães estando em contato constante com seus filhos, podem estar transmitindo uma cultura do corpo, um medo excessivo de engordar, que pode influenciar as crianças que se tornam extremamente sensíveis a este temor. As crianças podem associar o medo com a comida e se recusarem a comer. Pode não ser a mãe, mas qualquer figura que tenha contato e influência sobre a criança. O mais importante é que quando a criança recusa comida, geralmente também recusa vínculos sociais. Se, por exemplo, uma menina, tem medo que as pessoas pensem que ela está gorda, ela poderá evitar o contato e o convívio com outras crianças, e se isolar socialmente.

O perfil psicológico de uma criança com distúrbio alimentar é basicamente o de alguém frágil em suas emoções, com grande tendência ao perfeccionismo, que nunca está satisfeita consigo mesma, e que apresenta características de uma anorexia do tipo restritivo provavelmente será um jovem e adulto com fortes tendências perfeccionistas, que sempre buscará a perfeição em tudo que fizer, mesmo que “sacrifique” a sua vida. Se existe uma tendência à bulimia, apresentará mais impulsos autodestrutivos. Ambas são personalidades em desequilíbrio, que frequentemente coexistem com uma boa inteligência, aliada a uma grande capacidade de raciocínio (são consideradas “inteligentes”). Por tudo isso, é realmente um trabalho “artesanal” equilibrá-las. E, este é um trabalho de equipe, daí a necessidade de se trabalhar não somente com uma equipe multidisciplinar (médico, psicólogo e nutricionista), mas também com os pais, com a família, com os professores; enfim com todas aquelas pessoas que tem contato com a criança.

Existem várias patologias, como a depressão, associadas aos distúrbios alimentares; é muito comum que alguns dos familiares apresentem depressão, ou  algum tipo de fobia social. Muitas vezes pais com tais distúrbios, se mantém “socialmente distanciados”, o que favorece com que as crianças tenham uma dificuldade de se integrarem socialmente. Enfim, existe a necessidade de se trabalhar com a família para que eles possam reconhecer os seus próprios problemas.

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O aumento de caos de transtornos alimentares em crianças de 3 a 14 anos que anteriormente só aconteciam em jovens, leva a necessidade de se elaborarem programas de prevenção primária em escolas. Segundo uma pesquisa realizada na Espanha, constatou-se que de 90.000 alunos acompanhados e pesquisados desde 1987, 12% apresentavam distúrbios alimentares, e 2% patologias.

Hábitos perigosos

Não comer direito pode fazer com que as crianças fiquem doentes. Não comer comida suficiente ou comer alimentos e depois vomitar pode causar problemas relacionados ao crescimento e desenvolvimento de uma forma saudável. Se isso continuar por um longo tempo, as crianças podem ficar muito doentes.

Em alguns casos extremos, as crianças iniciam uma dieta e podem ficar extremamente magras e doentes. Por que, então, uma criança faria isso? Bem, não há apenas uma resposta – há muitas.

Alguns dizem que é porque existem muitas modelos excessivamente magras nas revistas, cinema ou TV. Vemos corpos destas pessoas na TV, na Internet ou em uma revista e podemos sentir que queremos ser como elas, também, porque elas parecem ricas e felizes o tempo todo.

Muitas pessoas gostariam de ser mais parecidas com celebridades ou com pessoas mais magras –  afinal não há nada de errado em querer ser mais magro, mais saudável, ou mais feliz. A maioria das crianças, não muda sua alimentação, mas apenas desfruta olhando fotos de pessoas famosas na internet e na TV.

Mas às vezes esse desejo de ser magra, ou assumindo que todas as pessoas magras são felizes, pode levar a algum pensamento e comportamento perigoso quando se trata de comida. Algumas iniciam uma dieta, o que significa que começam a comer menos alimentos – e, por vezes, a dieta pode ficar fora de controle. Algumas crianças na escola podem começar a competir sobre o quão pouco elas comeram naquele dia. Alguns se orgulham de não estar com fome ou não sentir necessidade de comer. Mas isto pode ser o começo de problemas alimentares pouco saudáveis.

Sintomas do Distúrbio Alimentar em Crianças

  • Alteração rápida, radical e persistente dos hábitos alimentares. O caso típico é o da menina que, de uma hora para outra, passa a comer apenas salada.
  • Hábitos alimentares inadequados para a faixa etária. Aos dois anos, por exemplo, é normal preferir a mamadeira. Aos quatro, não !
  • Aceitação de uma variedade muito pequena de alimentos. Fazer cara feia para algumas comidas faz parte da infância, mas uma criança que só aceita comer macarrão, tomate e uva, por exemplo, deve ser acompanhada pelo pediatra.
  • Resistência a compartilhar refeições, tanto em casa como na escola ou durante o lazer, com os amigos.
  • Déficit no crescimento (peso e/ou altura)

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Qualquer um pode ter um transtorno alimentar: meninos e meninas, crianças, adolescentes e adultos.

O que causa transtornos alimentares ?

Não há realmente nenhuma causa única para um distúrbio alimentar. A maioria das crianças que desenvolvem anorexia podem fazê-lo entre as idades de 11 e 14 (embora possa começar tão cedo quanto 7 anos), e há muitas razões. Algumas crianças simplesmente não se sentem bem em relação a si mesmas internamente e isso faz com que tentem mudar o “lado de fora”. Elas podem estar deprimidas ou estressadas sobre as coisas e, por isso, sentir como se elas não tivessem controle sobre suas vidas. Eles veem o que eles comem (ou não comem) como algo que podem controlar.

Às vezes as crianças envolvidas em certos esportes podem sentir que precisam mudar seu corpo ou serem magros para competir. Meninas que praticam balé, ginástica olímpica, e concursos de modelo, também podem estar mais propensas a desenvolver um transtorno alimentar. Todas essas meninas sabem que seus corpos estão sendo observados de perto, e elas podem desenvolver problemas ao tentar fazer com que seus corpos sejam mais “perfeitos”.

Quando os meninos desenvolvem distúrbios alimentares, geralmente é porque eles estão em um esporte que enfatiza o peso. Os lutadores competem com base em classes de peso. Lutadores sentem a pressão para ficar em sua categoria de peso, o que é chamado de “fazer peso.”

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Os transtornos alimentares também podem ser  “construídos em família”, o que significa que se alguém na família sofre de um transtorno alimentar, a criança pode estar em risco para o desenvolvimento de um, também. As crianças podem ser mais propensas a desenvolver um transtorno alimentar se um a mãe e/ou pai está muito preocupado ou reclama muito sobre sua própria aparência ou corpo.

Podemos supor que as raízes dos transtornos alimentares se encontrem na infância. Particularmente as meninas começam a associar beleza e sucesso com a magreza ainda na pré-escola. Em nossa cultura as crianças são encorajadas a acreditar que ser magra é uma necessidade. As meninas são expostas e esta mensagem com seus primeiros brinquedos, como as bonecas Barbie (magra e bela). Na nossa cultura os meninos são expostos ao físico padrão: forte, grande e musculoso (talvez exista aí, alguma semelhança com transtornos de imagem corporal, como a vigorexia). As crianças são vulneráveis a estas atitudes porque quando a gordura é vista como uma coisa má, a criança sente que é má. A gordura não é algo que você tem, ela é algo, você é. Nós não dizemos que “você tem a gordura,” nós dizemos, “você é gordo.” Nós nos identificamos com nossos corpos. Assim a criança começa a internalizar a mensagem que esta gordura é ruim.

Como a família pode ajudar as crianças a manter um peso mais saudável sem incutir a mensagem que a gordura é má, e que ser gordo é feio ?

  • Enfatize a confiança da criança com relação ao próprio corpo. É importante fazer com que a criança desenvolva uma consciência corporal.
  • Ensine sobre a diversidade das pessoas (pesos e alturas diferentes, não determinam quem as pessoas “são”). Cada pessoa tem seus atrativos. Cultue a ideia de que existem muitos pesos normais que estão de acordo com a idade, o peso e o sexo da pessoa.
  • Estimule a individualidade: “Você e seu corpo são únicos e originais”. E “Você tem o direito de se sentir bem consigo mesmo independente do seu aspecto e peso”.
  • Não defina os alimentos como “bons” ou “maus”. Com essa categorização dos alimentos você fará com que seu filho se torne vulnerável para ser um futuro candidato que irá resolver seus conflitos “emocionais com o alimento” (comendo demais ou de menos).
  • Discuta sobre alimentação e nutrição em termos de “combustível do corpo”, e não em categoria “bom/mau”.
  • Valorize o seu próprio corpo. Existem muitos pais que esperam que a criança tenha um comportamento “normal” e confiante em relação ao próprio corpo, quando eles mesmos não tem. Não adianta uma mãe dizer a filha o quanto ela é bonita, quando ela mesma vive se depreciando o tempo todo.
  • Não deixe a criança ser manipulada por publicidades. Ensine-a ser crítica como consumidora, não deixando que ela seja manipulada por falsos conceitos de beleza e felicidade.
  • Mostre para a criança que não é necessário ser “perfeito” para ser feliz, nem para ser amado.
  • Faça-a entender que todos têm capacidades e limitações. E que você não espera que ela seja capaz de TUDO.
  • Enfatize as qualidades dela e mostre que se sente orgulhosa
  • O esporte deve ser valorizado como diversão e uma oportunidade de se socializar fazendo novos amigos; não uma prática para “perder peso”, “emagrecer”, ou “ficar em forma”.
  • Uma alimentação variada é mais saudável.

Você não pode pegar um transtorno alimentar do jeito que você pode pegar um resfriado. Mas os amigos com quem a criança convive podem influenciar como ela se sente e se enxerga.

Se os amigos dela acham que a coisa mais importante é ser magra, ela pode começar a se sentir essa necessidade também. E se eles estão fazendo coisas “não saudáveis para serem magros”, ela pode sentir a pressão para fazê-lo, também.

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Transtornos Alimentares causam danos

Ninguém quer estar acima do peso, mas nosso corpo precisa de um pouco de gordura para ser saudável e crescer, especialmente durante a infância e adolescência. Alguém cujo peso fica muito baixo vai começar a ter problemas de saúde. Se isso continuar por muito tempo, esses problemas podem ser graves e muito perigosos.

Anorexia pode causar danos ao coração, fígado e rins. Uma menina com anorexia pode ter um atraso na chegada da primeira menstruarão ou parar de menstruar.  Alterações na respiração, queda da pressão arterial e no ritmo cardíaco também podem acontecer – esta é a maneira do corpo diminuir sua atividade para se proteger. Unhas podem quebrar e cabelo pode cair, também.

Crianças com anorexia, muitas vezes não se sentem bem – eles sofrem de dores de cabeça, tonturas e dificuldades de concentração. Eles também podem tornar-se isoladas socialmente e mal-humoradas.

Crianças com anorexia também podem sentir frio o tempo todo – mesmo em clima quente – porque elas não têm o suficiente de gordura corporal para mantê-las aquecidas. Às vezes, isso leva as crianças a usar um monte de camadas de roupa – para se aquecer – e às vezes elas estão tentando esconder seu corpo do olhar das outras pessoas.

Para as crianças com bulimia, o problema mais grave é que os vômitos significam uma perda de potássio, um nutriente importante. O potássio é encontrado em alimentos como bananas, tomates, feijão e melões. Muito pouco potássio pode levar a problemas cardíacos perigosos.

Pessoas com bulimia também podem danificar seus estômagos e rins e ter dor de estômago constante. Assim como as meninas com anorexia, meninas com bulimia também podem parar de menstruar.

Além dos problemas de saúde, as crianças que têm um distúrbio alimentar provavelmente não estão tendo uma infância “divertida”. Normalmente, essas crianças se afastam dos amigos. Elas não querem ter que sair e comer pizza com os amigos ou desfrutar de uma festa de aniversário.

A perda de peso não é normal, ou saudável, para as crianças porque eles estão crescendo

Se o seu filho pula refeições, torna-se obcecado com quantas calorias estão nos alimentos, usa roupas excessivamente folgadas ou muitas camadas de roupas o tempo todo, ou mesmo começa a se exercitar compulsivamente, estes podem ser sinais adicionais de que algo está errado.

Com bulimia, os sinais seria alguém que está armazenando ou comprando um monte de comida, em seguida, escondendo a compulsão e purgação.

Valeria Palazzo Valeria Lemos Palazzo

Autoria do texto:

Valéria Lemos Palazzo – Psicóloga e Neuropsicóloga

Idealizadora, Criadora e Coordenadora do GATDA – Grupo de Apoio e Tratamento dos Distúrbios Alimentares, da Ansiedade e de Humor