Etimologicamente, o termo anorexia deriva do grego “an”, deficiência ou ausência de, e “orexis”, apetite.
A anorexia nervosa já era um transtorno conhecido em épocas antigas.
Durante a Idade Média, as práticas de jejum foram compreendidas como estados de possessão demoníaca ou milagres divinos. Bell, em 1985, relata o comportamento anoréxico realizado por 260 santas italianas aparentemente em resposta à estrutura patriarcal a qual estavam submetidas, e conhecido como “anorexia sagrada”. Também na idade média se descreve a vida de algumas santas como Lidwina (Lydwine) de Shiedam, uma santa do século XIV que viveu na Holanda; ou a santa Wilgefortis, filha do rei de Portugal, que jejuou e rezou à Deus pedindo que ele tirasse a sua beleza, para desta forma afastar a atenção dos homens. Esta santa foi adotada em alguns países da Europa como santa patrona daquelas mulheres que desejavam ver-se livres da atenção masculina. A mais famosa anoréxica da história é Santa Caterina de Siena (1347), que aos 7 anos começou a recusar os alimentos, e na adolescência só se alimentava de pão e ervas. Ingressou na ordem das Dominicanas e foi conselheira do Papa Gregório IX em Avignon. Ao perceber que suas tentativas de unificação do papado não deram resultado, se sentiu fracassada. Após este acontecimento deixou de alimentar-se e morreu. No século IX em Avicena, o príncipe Hamadham estava morrendo por não se alimentar, vítima de uma imensa melancolia. Esta é a primeira referência de uma anoréxica em um contexto médico, ainda que proveniente de um quadro depressivo
Em 1694, Morton descreveu a “extenuação nervosa”, considerando-se esta a primeira descrição clínica do transtorno. Mas foi William Gull quem utilizou pela primeira vez a expressão “anorexia nervosa” em uma conferência dada em Oxford (Gull 1874): “forma peculiar de doença que afeta principalmente mulheres jovens e caracteriza-se por emagrecimento extremo” cuja “falta de apetite é decorrente de um estado mental mórbido e não a qualquer disfunção gástrica”. Gull descartou a possibilidade que uma enfermidade orgânica justificasse a anorexia. Na mesma época e de maneira quase simultânea, se produziu a descrição da doença por Laségue (1873), qualificando-a de inanição histérica e considerando-a, da mesma forma que Gull, uma doença psicogênica (Toro,1996).
No final do século XIX, em 1893, Freud descreveu um caso de anorexia tratado com hipnose, um ano mais tarde descreveu a doença como uma psiconeurose de defesa, ou neurose da alimentação com melancolia.
No começo do século XX, a anorexia começa a ser tratada sobre um ponto de vista endocrinológico, assim em 1914 Simonds um patologista alemão, descreveu uma paciente caquética, a quem, ao fazer-lhe uma autópsia encontrou uma destruição pituitária e durante os 30 anos seguintes, reinou a confusão entre insuficiência pituitária (doença de Simonds) e anorexia nervosa.
A partir dos anos 30, a anorexia passa a ser estudada principalmente sobre o ponto de vista psicológico, deixando no esquecimento as antigas discussões sobre a origem endócrino ou psicológica do transtorno.
Russel em 1970 e 1977 tenta mostrar a relação entre as teorias biológicas da origem da doença com as psicológicas e sociológicas, e chegou as seguintes conclusões:
- O transtorno psíquico provoca a diminuição da ingestão de alimentos e a perda de peso.
- A perda de peso é a causa do transtorno endócrino.
- A desnutrição piora o transtorno psíquico.
- O transtorno psíquico também pode agravar de maneira direta a função hipotalâmica e produzir amenorreia.
- É provável que exista uma relação entre um transtorno do controle do hipotálamo na ingestão e na recusa da alimentação, característico da anorexia
- O transtorno hipotalâmico poderia alterar as funções psíquicas, gerando atitudes anômalas frente ao alimento, imagem corporal e sexualidade.
Mesmo no século 19, os psiquiatras viram pacientes com transtornos alimentares. As imagens abaixo, publicadas em Paris em 1892, mostram uma jovem mulher com ” anorexia histérica visceral “, que gradualmente desistiu de comer até que ela desenvolveu caquexia – uma condição onde o corpo está tão desnutrido que não pode ser revertida. Naquela época, anorexia foi pensado como uma doença de adolescentes.
Hoje, os pesquisadores acreditam que há uma forte correlação entre a representação das mulheres e anorexia na adolescência da mídia. Mas os sintomas da doença permanecem relativamente inalterada desde o século 19 – quando as mulheres robustas foram consideradas atraentes.
Autoria do texto:
Valéria Lemos Palazzo – Psicóloga e Neuropsicóloga
Idealizadora, Criadora e Coordenadora do GATDA – Grupo de Apoio e Tratamento dos Distúrbios Alimentares, da Ansiedade e de Humor