Ao longo da história o significado da palavra bulimia tem seguido diferentes trajetórias.
O termo “bulimia” remonta a antiga Grécia, a palavra derivaria do termo grego”bous”, boi e “limos”, fome. Arstófanes usava o termo como sinônimo de fome voraz. Durante o período medieval e moderno tem servido para designar episódios de “voracidade insaciável”, “mórbido”, como um “apetite canino”, com ou sem a presença de vômitos e acompanhado de outros sintomas.
O comportamento de induzir o vômito pode ser encontrado desde a antiguidade e observado como uma prática valorizada por muitos anos. Os egípcios antigos, por exemplo, vomitavam e usavam purgativos por três dias consecutivos a cada mês, em razão da crença de que todas as doenças eram provenientes da comida. Da mesma forma, Hipócrates indicava a indução do vômito como forma de prevenir doenças, recomendando o ato por dois dias consecutivos todo mês. O vomitorium, criado pelos romanos , era um local destinado ao vômito após grande ingestão de alimentos durante os banquetes. Observa-se que os eméticos, bem como os purgantes, foram, durante um longo período uma das poucas prescrições médicas para qualquer tipo de doença.
Stunkard em 1990 realizou uma revisão histórica do conceito de bulimia, e destacou, como em 1743 James descreveu no Dicionário Médico da Universidade de Londres, um quadro clínico que denomina “True Boulimus” (verdadeira bulimia, em uma tradução livre), caracterizado por intensa preocupação com a comida, e pela ingestão voraz em um curto espaço de tempo, seguidos de períodos de jejum, e destacou uma segunda variante “Caninus Appetitus” aonde os episódios de voracidade são seguidos pelo comportamento compensatório de vomito.
Galeno descreveu a “Kinos orexia”, ou fome canina como sinônimo de bulimia, considerando-a como conseqüência de um estado de ânimo anormal, posteriormente esta definição apareceu nos dicionários médicos dos séculos XVIII e XIX na forma de curiosidade médica. No século XIX Blanchez no Dicionário de Ciências Médicas de Paris (1869) também descreveu ambos os quadros. No final dos anos 70, foi descrita como a síndrome de atrações/purgações ou bulimarexia. A denominação bulimia apareceu pela primeira vez em 1980, finalmente em 1987 se adotou o termo bulimia nervosa.
Vemos portanto, que a bulimia não é um transtorno novo, já que aparece reconhecido há séculos na literatura, mas até os finais dos anos 70 quando se diferencia como identidade psicológica independente. Russell em 1979 foi o primeiro a fazer uma descrição completa do quadro clínico, em estabelecer os primeiros critérios diagnósticos para este transtorno, e introduzir o termo “Bulimia Nervosa”. Um ano mais tarde a American Psychiatric Association (APA) incluiu este transtorno no Manual Diagnóstico DSM-III(1980).
Russel em 1979 definiu 3 características fundamentais
- Os pacientes sofrem impulsos fortes e incontroláveis de comer em excesso
- Buscam evitar o aumento de peso, com vômitos e/ou abuso de laxantes ( ou outros medicamentos)
- Medo mórbido de engordar
Em 1983 Russel acrescentou outro critério diagnóstico:
- A exigência de um episódio anterior, manifesto ou crítico de Anorexia Nervosa.
Desde então se incluiu uma nova questão que continua sendo muito debatida na atualidade. A possível relação entre os diferentes distúrbios alimentares. Não é raro que um/a paciente com anorexia nervosa evolucione, no futuro, para uma bulimia nervosa, existem autores que falam em um “continuum” entre ambos distúrbios. A partir deste momento, se promoveu amplamente a investigação dos distúrbios alimentares, o que permitiu uma melhor delimitação dos distintos quadros clínicos que hoje em dia são reconhecidos nas classificações atuais.